sábado, 24 de julho de 2010

diálogo de reis IV

- Sabe..
- Hã?
- Também não gosto de nada disso.
- Nada disso o quê?
- Isso ué.
- Não entendi.
- De distância, saudade.
- Até que é bom.
- (silêncio)
- Pro reencontro, digo.
- (silêncio)
- Isso de saber que se tem.
- Que tal um passeio?
- Como?
- No alto de um morro bem frio.
- Agora?
- É.
- E depois?
- Depois também
- E depois?
- Também.
- E quando acaba?
- Não acaba. Aí onde quero chegar.
- Isso soa familiar.
- (silêncio)
- Podemos ir de helicóptero?
- Que tal balões?
- Só nós dois?
- E de lá vamos pro infinito.
- Impossível.
- Faz o seguinte. A gente se casa.
- Casemos, então.















"Só conheço uma liberdade,
a do pensamento."

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Livre-se asas.

Aconteceu que, seja como for (pois independe da lenda), Dédalo, junto ao seu filho Ícaro, foi preso no labirinto do Minotauro (que já estava morto à essa altura da história), que ele próprio construiu. Então, juntou asas de gaivota e cera do mel de abelhas, e delas fez dois pares de asas pra que ele e seu filho pudessem se salvar. Dédalo lembrou de alertar o menino a não subir tão alto que aproxime-se demais do sol, nem tão baixo que sinta a brisa do mar. Mas, extasiado com a liberdade das penas, Ícaro se esquece dos conselhos do pai e rasga as nuvens rumo ao astro luminoso... Voa tão alto quanto consegue voar! Com a alta temperatura a cera das penas do jovem-alado foi se derretendo, as asas se desmanchando e sua história terminando no fundo da beira do mar. Enquanto Dédalo, entre lágrimas, chegava seguro à costa lamentando a (in)fortuna da sorte de poder voar.


Pintura: "A queda de Ícaro" - óleo s/tela - de JFMachado

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Canção da Falsa Tartaruga


"Cante a 'Sopa de Tartaruga' para ela, certo companheira? A Tartaruga Falsa soluçou profundamente, e começou a cantar, numa voz entremeada por soluços:

'Que bela Sopa, suculenta e trigueira,
Espera por nós na quente sopeira!
Quem por ela não suspira, não diz opa?
Sopa da noite, que bela Sopa!
Sopa da noite, que bela Sopa!
Ooooó... Bela Sooo... paa!
Ooooó... Bela Sooo... paa!
Sooo... paa da nooo... iii... teee,
Bela, bela Sopa!
Que bela Sopa! Quem quer saber de pastel,
Assado ou outro pitéu?
Uma sopinha fumegando no prato,
Não é de se tirar o chapéu?
Ooooó... Bela Sooo... paa!
Ooooó... Bela Sooo... paa!
Ooooó BEEELA SOOPA!

'O refrão de novo!' gritou o Grifo, e a Tartaruga Falsa estava começando a repeti-lo quando se ouviu um brado à distância: 'O julgamento está começando!'.

'Vamos!' gritou o Grifo, e tomando Alice pela mão, saiu correndo, sem esperar pelo fim da canção.

'Que julgamento é esse?' perguntou Alice, ofegante, enquanto corria; mas o Grifo respondeu apenas 'Vamos!' e correu ainda mais depressa, enquanto, cada vez mais tenuemente, carregadas pela brisa que os seguia, lhes chegavam as palavras melancólicas:

Sooo... paa da nooo... iii... teee,
Bela, bela Sopa!
"


(retirado de "Aventuras de Alice no País das Maravilhas", de Lewis Carrol, tradução de Maria Luiza X. de A. Borges)

sábado, 10 de julho de 2010

título preto e branco de um post preto e branco.

Cômodo preto e branco. Luz preto e branca. Menina preto e branca.
Voz em off: Me deixa fazer parte.

Menina preto e branco faz que não com a cabeça preto e branca. Aperta o bolso preto e branco da camisa preto e branca.

Cômodo:
Deixa fazer parte.
Luz: Deixa fazer parte.
Bolso: Deixa fazer parte.
Camisa: Deixa fazer parte.

Parede preto e branca. Guarda-roupa preto e branco. Cama preto e branca. Lençóis preto e brancos. Janela preto e branca com cortina preto e branca. Sapo de pelúcia preto e branco. Menina preto e branca chora lágrimas preto e brancas enquanto ri transtornada risadas preto e brancas.

Sapo:
Deixa fazer parte.
Parede: Deixa fazer parte.
Guarda-roupa: Deixa fazer parte.
Cama: Deixa fazer parte.
Janela: Deixa fazer parte.
Lençóis: Deixa fazer parte.
Cortina: Deixa fazer parte.
Lágrimas: Deixa fazer parte.
Risadas: Deixa fazer parte.

Menina preto e branca liga som preto e branco, dele saem notas preto e brancas em pautas preto e brancas. Soa o som preto e branco numa melodia preto e branca.

Som: Deixa fazer parte.
Notas: Deixa fazer parte.
Pautas: Deixa fazer parte.
Melodia: Deixa fazer parte.

Menina preto e branca desiste e desliga o som preto e branco, então abre a janela preto e branca. Borboletas preto e brancas e pássaros preto e brancos entram cada qual carregando uma ponta preto e branca de um pano preto e branco que carrega bolhas de tinta preto e brancas.

Janela:
Deixa fazer parte.
Borboletas: Deixa fazer parte.
Pássaros: Deixa fazer parte.
Bolhas: Deixa fazer parte.

Menina preto e branca relutante faz que sim com a cabeça preto e branca, pega no bolso preto e branco uma chave preto e branca: abre um baú preto e branco - que estava no guarda-roupa preto e branco - de onde tira outra chave preto e branca. Destranca a própria boca preto e branca e vomita... Vomita colorido.

O mundo então se cala.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

frase roubada.

da pedagogia do teatro. da menina de olhos estalados. da criança/adulta de cachos dourados:

"Toda certeza absoluta pode ser simples gravidez psicológica" (Morin)

sábado, 3 de julho de 2010

Baile do Príncipe


Mais um vídeo da minissérie 'Hoje é dia de Maria'. Nesse trecho passa a cena do 'Baile do Príncipe' (parodia da Cinderela), mas chamo atenção para os bonecos: de até 3 metros de altura, foram feitos em papel e telas metálicas remetendo à silhuetas de insetos. O Príncipe não tem rosto, e como os demais bonecos da 'corte' também não tem cor.